EUTANASIA
Eutanásia (do grego ευθανασία - ευ "bom", θάνατος
"morte") é a prática pela qual se abrevia a vida de um enfermo
incurável de maneira controlada e assistida por um especialista.
A eutanásia representa atualmente uma complicada questão de
bioética e biodireito, pois enquanto o Estado tem como princípio a proteção da
vida dos seus cidadãos, existem aqueles que, devido ao seu estado precário de
saúde, desejam dar um fim ao seu sofrimento antecipando a morte.
Independentemente da forma de Eutanásia praticada, seja ela
legalizada ou não (tanto em Portugal como no Brasil esta prática é considerada
ilegal), ela é considerada um assunto controverso, existindo sempre prós e
contras – teorias eventualmente mutáveis com o tempo e a evolução da sociedade,
tendo sempre em conta o valor de uma vida humana. Sendo eutanásia um conceito
muito vasto, distinguem-se aqui os vários tipos e valores intrinsecamente
associados: eutanásia, distanásia, ortotanásia, a própria morte e a dignidade
humana.
Em primeiro lugar, é importante ressaltar que a eutanásia
pode ser dividida em dois grupos: a "eutanásia ativa" e a "eutanásia
passiva". Embora existam duas "classificações" possíveis, a
eutanásia em si consiste no ato de facultar a morte sem sofrimento a um
indivíduo cujo estado de doença é crónico e, portanto, incurável, normalmente
associado a um imenso sofrimento físico e psíquico.
A "eutanásia ativa" conta com o traçado de acções
que têm por objetivo pôr término à vida, na medida em que é planeada e
negociada entre o doente e o profissional que vai levar e a termo o ato.
A "eutanásia passiva" por sua vez, não provoca
deliberadamente a morte, no entanto, com o passar do tempo, conjuntamente com a
interrupção de todos e quaisquer cuidados médicos, farmacológicos ou outros, o
doente acaba por falecer. São cessadas todas e quaisquer ações que tenham por
fim prolongar a vida. Não há por isso um ato que provoque a morte (tal como na
eutanásia ativa), mas também não há nenhum que a impeça (como na distanásia).
É relevante distinguir eutanásia de "suicídio
assistido", na medida em que na primeira é uma terceira pessoa que executa,
e no segundo é o próprio doente que provoca a sua morte, ainda que para isso
disponha da ajuda de terceiros.
Etimologicamente, distanásia é o oposto de eutanásia. A
distanásia defende que devem ser utilizadas todas as possibilidades para
prolongar a vida de um ser humano, ainda que a cura não seja uma possibilidade
e o sofrimento se torne demasiadamente penoso.
Argumentos
A favor
Para quem argumenta a favor da eutanásia, acredita-se que
esta seja um caminho para evitar a dor e o sofrimento de pessoas em fase
terminal ou sem qualidade de vida, um caminho consciente que reflete uma
escolha informada, o término de uma vida em que, quem morre não perde o poder
de ser ator e agente digno até ao fim.
São raciocínios que participam na defesa da autonomia
absoluta de cada ser individual, na alegação do direito à autodeterminação,
direito à escolha pela sua vida e pelo momento da morte. Uma defesa que assume
o interesse individual acima do da sociedade que, nas suas leis e códigos, visa
proteger a vida. A eutanásia não defende a morte, mas a escolha pela mesma por
parte de quem a concebe como melhor opção ou a única.
A escolha pela morte não poderá ser irrefletida. As
componentes biológicas, sociais, culturais, econômicas e psíquicas têm que ser
avaliadas, contextualizadas e pensadas, de forma a assegurar a verdadeira
autonomia do indivíduo que, alheio de influências exteriores à sua vontade, certifique
a impossibilidade de arrependimento.
Quando uma pessoa passa a ser prisioneira do seu corpo,
dependente na satisfação das necessidades mais básicas; o medo de ficar só, de
ser um "fardo", a revolta e a vontade de dizer "Não" ao
novo estatuto, levam-no a pedir o direito a morrer com dignidade. Obviamente, o
pedido deverá ser ponderado antes de operacionalizado, o que não significa a
desvalorização que tantas vezes conduz esses homens e mulheres a lutarem pela
sua dignidade anos e anos na procura do não prolongamento de um processo de
deterioramento ou não evolução.
"A dor, sofrimento e o esgotamento do projeto de vida,
são situações que levam as pessoas a desistirem de viver" (Pinto, Silva –
2004 - 36) Conduzem-nas a pedir o alívio da dor, a dignidade e piedade no
morrer, porque na vida em que são "atores" não reconhecem qualidade.
A qualidade de vida para alguns homens não pode ser um demorado e penoso
processo de morrer.
No Brasil, normalmente é apontado como suporte a essa posição
o art. 1º, III, da Constituição Federal, que reconhece a "dignidade da
pessoa humana" como fundamento do Estado Democrático de Direito, bem como
o art. 5º, III, também da Constituição da República, que expressa que
"ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou
degradante", além do art. 15 do Código Civil que expressa que
"Ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de morte, a
tratamento médico ou a intervenção cirúrgica", o que autoriza o paciente a
recusar determinados procedimentos médicos, e o art. 7º, III, da Lei Orgânica
de Saúde, de nº 8.080/90, que reconhece a "preservação da autonomia das
pessoas na defesa de sua integridade física e moral".
No Estado brasileiro de São Paulo, existe a Lei dos Direitos
dos Usuários dos Serviços de Saúde do Estado de São Paulo, de nº 10.241/99, que
em seu art. 2º, Inciso XXIII, expressa que são direitos dos usuários dos
serviços de saúde no Estado de São Paulo "recusar tratamentos dolorosos ou
extraordinários para tentar prolongar a vida".
A autonomia no direito a morrer não é permitida em detrimento
das regras que regem a sociedade, o comum, mas numa política de contenção
económica, não serão os custos dessa obrigatoriedade elevados?
Além do mais, em um país como o Brasil, onde o acesso à saúde
pública não é satisfatório, a prática da eutanásia é muitas vezes encarada como
um modo de proporcionar a doentes de casos emergenciais uma vaga nos
departamentos de saúde.
Contra
Muitos são os argumentos contra a eutanásia, desde os
religiosos, éticos até os políticos e sociais. Do ponto de vista religioso a
eutanásia é tida como uma usurpação do direito à vida humana, devendo ser um
exclusivo reservado ao Senhor, ou seja, só Deus pode tirar a vida de alguém.
"algumas religiões, apesar de estar consciente dos motivos que levam a um
doente a pedir para morrer, defende acima de tudo o caráter sagrado da
vida,…" (Pinto, Susana; Silva, Florido,2004, p. 37).
Da perspectiva da ética médica, tendo em conta o juramento de
Hipócrates, segundo o qual considera a vida como um dom sagrado, sobre a qual o
médico não pode ser juiz da vida ou da morte de alguém, a eutanásia é
considerada homicídio. Cabe assim ao médico, cumprindo o juramento Hipocrático,
assistir o paciente, fornecendo-lhe todo e qualquer meio necessário à sua
subsistência. Para além disto, pode-se verificar a existência de muitos casos
em que os indivíduos estão desenganados pela Medicina tradicional e depois
procurando alternativas conseguem curar-se.
"Nunca é lícito matar o outro: ainda que ele o quisesse,
mesmo se ele o pedisse (…) nem é lícito sequer quando o doente já não estivesse
em condições de sobreviver" (Santo Agostinho in Epístola).
Outro dos argumentos contra, centra-se na parte legal, uma
vez que o Código Penal atual não especifica o crime da eutanásia, condenando
qualquer ato antinatural na extinção de uma vida. Sendo quer o homicídio
voluntário, o auxilio ao suicídio ou o homicídio mesmo que a pedido da vitima
ou por "compaixão", punidos criminalmente.
O dicionário Houaiss diz que eutanásia é “ato de proporcionar
morte sem sofrimento a um doente atingido por afecção incurável que produz
dores intoleráveis”. O dicionário Aurélio afirma que eutanásia é: “1. Morte
serena, sem sofrimento. 2. Prática pela qual se busca abreviar, sem dor ou
sofrimento, a vida dum enfermo reconhecidamente incurável”. O dicionário De
Plácido e Silva, considera que Eutanásia é “derivado do grego eu (bom) e
thanatos (morte) quer significar, vulgarmente, a boa morte, a morte calma, a
morte doce e tranquila".
Juridicamente, entende-se o direito de matar ou o
direito de morrer, em virtude de razão que possa justificar semelhante morte,
em regra provocada para término de sofrimentos, ou por medida de seleção, ou de
eugenia. A eutanásia provocada por outrem, ou a morte realizada por
misericórdia ou piedade, constitui o homicídio ou criem eutanásico, considerado
como a suprema caridade. Não é, no entanto, a eutanásia admitida pelo nosso
Direito Penal. Mas admitem-na outras legislações. E ainda apegando-nos as
referências essências da ética, e em particular a da moral católica, que
desenvolveu amplamente os temas relacionados a bioética, devemos esclarecer o
alcance do assunto correlativo, que leva o nome de “dignidade da morte” ou de
“humanização da morte”.
A eutanásia é um assunto que sempre foi discutido,
afinal era muito utilizada principalmente por povos primitivos, como afirma o
criminalista Luiz Flávio Borges D’Urso. Há muito tempo atrás os Celtas tinham
em sua cultura o “hábito que os filhos matassem os seus pais quando estes
estivessem velhos e doentes” e na Índia era ainda pior, “os doentes incuráveis
eram levados até a beira do rio Ganges, onde tinham as suas narinas e a boca
obstruídas com o barro”, muito tempo se passou e este assunto foi discutido por
muitos filósofos como Platão, Sócrates. Mais tarde, no século XX na Europa,
pensou em usar este procedimento para eugenia, eliminando assim os que para a
sociedade não são “prósperos”, sendo uma verdadeira matança. Um fato recente
ocorrido no Brasil foi em 1996, quando no Senado Federal o senador Gilvam
Borges (PMDB-AP), propôs um projeto de lei (125/96) que pretendia liberar a
prática em algumas situações, sendo arquivada pelos parlamentares.
Diferentemente deste é o conceito do deputado Osmâmio Pereira (PTB-MG) do qual,
indagou a idéia de ser considerada a eutanásia crime hediondo, sendo o seu
projeto de lei também arquivado.
Logo entendemos que no Brasil este
procedimento não é aceito e sequer é mencionado na Constituição Federal, e
ainda alguns juristas acreditam que quando é praticada essa conduta pode ser
aplicado ao autor o artigo 121 do código penal que é “matar alguém”,
considerado crime doloso. Mais recentemente ainda, a campanha da fraternidade
lançada pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) em 2008,
“Escolhe, pois a vida” se manifestava dentro outras coisas, contra a eutanásia.
Sendo no Brasil a eutanásia considerada homicídio dolosa.
Perspectivas
O doente
“Mar… doce mar…
Que embalas nas tuas ondas
Os humanos pecadores!
Mar… doce mar…
Que transportas em teu ventre Vida Celeste e rancor…
Mar…doce mar…
Embala-me a mim…
Com tua suave canção de amor
Eleva-me aos céus,
Aquece-me a alma…
Leva o meu corpo
Afagado entre abraços
De onda e de sal,
Mar…doce mar…”
— Inês Cunha
As pessoas com doença crônica e, portanto, incurável, ou em
estado terminal, têm naturalmente momentos de desespero, momentos de um
sofrimento físico e psíquico muito intenso, mas também há momentos em que vivem
a alegria e a felicidade. Estas pessoas lutam dia após dia para viverem um só
segundo mais. Nem sempre um ser humano com uma determinada patologia quer
morrer "porque não tem cura"!
Muitas vezes acontece o contrário,
tentam lutar contra a Morte, tal como refere Lucien Israël: "Não defendem
uma politica do tudo ou nada. Aceitam ficar diminuídos desde que sobrevivam, e
aceitam sobreviver mesmo que sintam que a doença os levará um dia. (…)
dizem-nos com toda a simplicidade: se for necessário, eu quero servir de
cobaia. (…) arriscam o termo para nos encorajarem à audácia. (Israël, Lucien;
1993; 86-87).
Contrariando esta tendência de luta a todo o custo, em alguns
casos surgem os doentes que realmente estão cansados de viver, que não aguentam
mais sentirem-se "um fardo", ou sentirem-se sozinhos, apenas
acompanhados por um enorme sofrimento de ordem física, psíquica ou social. Uma
pessoa cuja existência deixou de lhe fazer sentido sofre, no seu íntimo, e
muitas vezes isolada no seu mundo interior; sente que paga a cada segundo que
passa uma pena demasiadamente pesada pelo simples facto de existir.
Nesta altura, e quando a morte parece ser a única saída que o
doente vislumbra, dever-se-á informar o doente dos efeitos, riscos, dos
sentimentos, das reacções que a Eutanásia comporta, da forma como é ou vai ser
praticada. Só assim o doente poderá decidir conscienciosamente e ter a certeza
de que, para si, essa é a melhor opção. No entanto, e a par da informação, o
doente deve ser acompanhado psicologicamente, a fim de se esclarecer que este
não sofre de qualquer distúrbio mental, permanente ou temporário, e está
capacitado para decidir por si e pela sua Vida.
Há autores que defendem que um ser humano, ainda que a sofrer
demasiado, se bem tratado, não pede a Eutanásia. Hoje em dia podem ser
administrados analgésicos e outros fármacos que minimizam o sofrimento e
efeitos da doença e de intervenções técnicas, a uma pessoa em estado terminal.
"Não podemos admitir que estas pessoas não tenham um
acompanhamento digno na sua morte e no seu percurso até ela. Não podemos fechar
os olhos a alguém que com muito sacrifício se abre connosco e manifesta o
desejo de morrer; não podemos ignorar um pedido de Eutanásia e deixá-lo passar
em branco! Os pedidos de Eutanásia por parte dos doentes são muitas vezes
pedidos de ajuda, implorações para que se pare o seu sofrimento! Segundo estes
autores, a maioria das pessoas que se encontram na recta final da sua vida, não
desiste! Estas pessoas "Persistem e dão-nos coragem para fazermos o
mesmo." (Israël, Lucien; 1993;87).
Talvez a esta altura seja pertinente pensarmos que um dia
podemos ser nós, um familiar ou um amigo próximo, a estar numa situação em que
"não há mais nada a fazer"; para essas pessoas, resta-lhes a
esperança e apoio da família. Muitas pessoas que se encontram nesta fase,
sentem-se um peso pela doença e a necessidade de cuidados e pela preocupação e
o cansaço estampados nos rostos daqueles que amam e estavam habituados a ver
sorridentes.
No entanto, e após as relações anteriores, não é correto
pensar que um pedido de Eutanásia não possa ser um pedido refletido e ser a
verdadeira vontade daquele Ser Humano, alheia a factores económicos, sociais,
culturais, religiosos, físicos e psíquicos.
Família e sociedade
O Homem como animal cultural, social e individual, quando
inserido nos diferentes grupos, vai oferecer-lhes toda a sua complexidade que
caracteriza o particular e o comum aos diferentes elementos que os constituem.
A família grupo elementar que é para cada indivíduo e para a Sociedade, quando
confrontado com a morte reage na sua especificidade que a caracteriza, quando o
confronto é com as diferentes situações que podem levar um ser humano a lutar
pelo direito a morrer, essas especificidades não desaparecem.
É a diferença essencialmente cultural e social, que faz com
que a legislação mude de país para país, que faz com que os Países Baixos tenha
legalizado a eutanásia e o nosso país não.
Num país como Portugal em que a morte tem perdido
visibilidade, é excluída de práticas antigas, os familiares são afastados, as
crianças não sabem o que é, os processos de luto são cada vez menos vividos e
morre-se mais nos hospitais, no lar ou em casa dependente nos cuidados. Uns por
opção e altruísmo, pelo manter do seu papel e estatuto social, como opção
lúcida e reconhecida; outros por medo, por a família não aceitar ou não querer
vivenciar essa última fase em que culmina a vida.
Em Portugal morrer sozinho pode ser mais do que um título, é
muitas vezes realidade ou uma escolha.
Num país em que esperança média de vida aumenta, em que a
todo o momento se vende o light e o saudável, contrasta a realidade dos
acidentes vasculares cerebrais (AVC) como primeira causa de morte e as doenças
de foro oncológico como segunda. Muitas doenças "arrastam-se" para a
cronicidade com o aumento de esperança de vida vigente na nossa Sociedade. No
nosso país a maioria das pessoas quer salvar, ainda não considera o término do
sofrimento como algo qualitativo, em detrimento do arrastar da decadência
física e psíquica. O "fazer tudo que estiver ao seu alcance para manter a
vida" é o mais aceite na nossa Sociedade, no entanto o acto de promover a
morte antes do que seria de esperar, por motivo de compaixão e diante de um
sofrimento penoso e insuportável, sempre foi motivo de reflexão por parte da Sociedade.
Frequentemente a família divide-se entre o que existe entre a eutanásia e a
distanásia.
Salvar, fazer uso dos meios, do conhecimento, dos dadores, de
todos os recursos para salvar é lógico. No entanto, os cuidados paliativos que
visam a melhor qualidade de vida possível para o doente e para a família, pode
ou não equivaler a definição de qualidade desses intervenientes, o que pode
levantar dúvidas, despoletar as habituais polémicas associadas ao debate do
tema. Quando se fala neste, as opiniões divergem, o debate acende-se e os
extremos refutam com prós e contras, sendo a maioria contra.
Num país laico, como Portugal, em que a maioria da sua
população é de orientação religiosa cristã, rege-se pela palavra de Deus
inscrita na Bíblia, segue maioritariamente o que Deus ordena; "Não
matarás". Também por isto é fácil compreender o número de famílias que não
considera eutanásia como opção.
Perante o tabu da morte e a família como um elemento cuidador
e na sociedade, existe inúmeros contextos e particularidades é necessário
definir o comum. A eutanásia continuará a suscitar grande polémica na
sociedade, de argumentos supostamente válidos entre os que defendem a
legalização e os que a condenam, havendo assim necessidade de compreender a
moral à prática concreta dos homens enquanto membros de uma dada sociedade, com
condicionalismos diversos e específicos, e refletir sobre essas práticas
(ética), afinal a vida humana é direito em qualquer sociedade.
A óptica da enfermagem
O exercício da atividade profissional de enfermagem, pauta-se
pelo respeito à dignidade humana desde o nascimento à morte, devendo o
enfermeiro ser um elemento interveniente e participativo em todos os atos que
necessitem de uma componente humana efetiva por forma a atenuar o sofrimento,
todos os actos que se orientem para o cuidar, individualizado e holístico.
As necessidades de um doente em estado terminal, muitas vezes
isolado pela sociedade, aumentam as exigências no que respeita a cuidados de
conforto que promovam a qualidade de vida física, intelectual e emocional sem
descurar a vertente familiar e social.
Apesar desta consciência, lidar com situações limite,
potencia um afastamento motivado por sentimentos de impotência perante a
realidade. Este contexto agrava-se se o profissional de saúde (cuidador) for
confrontado com uma vontade expressa pelo doente em querer interromper a sua
vida. Como agir perante o princípio de autonomia do doente? Como agir perante o
direito de viver? Perante este quadro, com o qual nos poderemos deparar um dia,
há que ter um profundo conhecimento das competências, obrigações e direitos
profissionais, de forma a respeitar e proteger a vida como um direito
fundamental das pessoas.
Legislação
República Portuguesa
Na Lei Fundamental de Portugal Constituição da República
Portuguesa pode-se observar:
Art. 1º
Portugal é uma República soberana, baseada na dignidade da
pessoa humana e na vontade popular e empenhada na construção de uma sociedade
livre, justa e solidária.
E se alguma dúvida ainda subsistisse na interpretação do seu
art. 1º, quanto ao respeito pela vida humana, a mesma se dissipa atento o
disposto no seu:
Art. 16º n.2
Os preceitos constitucionais e legais relativos aos direitos
fundamentais devem ser interpretados e integrados de harmonia com a Declaração
universal dos direitos do Homem., onde regulamenta que:
Art. 3º
Todo o indivíduo tem direito à vida à liberdade e à segurança
pessoal.
Art. 24º n.1
A vida humana é inviolável.
Art. 25º n.2
A integridade moral e física das pessoas é inviolável.
O Código Penal Português trata este assunto com um rigor
acentuado havendo severas penalizações no que se concerne à prática da
eutanásia:
Artigos 133º e 134º - Eutanásia activa:
Art. 133º (Homicídio privilegiado)
Quem matar outra pessoa dominado por compreensível emoção
violenta, compaixão, desespero ou motivo de relevante valor social ou moral,
que diminuam sensivelmente a sua culpa, é punido com pena de prisão de 1 a 5
anos.
Art. 134º (Homicídio a pedido da vítima)
Quem matar outra pessoa determinado por pedido sério,
instante e expresso que ela lhe tenha feito é punido com pena de prisão até 3
anos.
A tentativa é punível.
Artigo 138º - Eutanásia passiva:
Art. 138º (Exposição ou abandono)
Quem colocar em perigo a vida de outra pessoa:
a) expondo-a em lugar que a sujeite a uma situação de que
ela, só por si, não possa defender-se, ou
b) abandonando-a sem defesa, em razão de idade, deficiência
física ou doença, sempre que ao agente coubesse o dever de a guardar, vigiar ou
assistir, é punido com pena de prisão de 1 a 5 anos.
Se o fato for praticado por ascendente ou descendente,
adoptante ou adoptado da vítima, o agente é punido com pena de prisão de 2 a 5
anos.
Se do fato resultar:
a) Ofensa à integridade física grave, o agente é punido com
pena de prisão de 2 a 8 anos;
b) A morte, o agente é punido com pena de prisão de 3 a 10
anos.
Artigo 132º - Eutanásia eugénica:
Art.132º (Homicídio qualificado)
Se a morte for produzida em circunstâncias que revelam
especial censurabilidade ou perversidade, o agente é punido com pena de prisão
de 12 a 25 anos.
É susceptível de revelar especial censurabilidade ou
perversidade a que se refere o número anterior, entre outras, a circunstância
do agente:
a) Ser descendente ou ascendente, adoptado ou adoptante, da
vítima;
b) Empregar tortura ou acto de crueldade para aumentar o
sofrimento da vítima;
c) Ser determinado por avidez, pelo prazer de matar, ou para
satisfação do instinto sexual ou por qualquer motivo torpe ou fútil;
d) Ser determinado por ódio racial, religioso ou político;
e) Ter em vista preparar, facilitar, executar ou encobrir um
outro crime, facilitar a fuga ou assegurar a impunidade do agente de um crime;
f) Utilizar veneno, qualquer outro meio insidioso ou que se
traduza na prática de crime de perigo comum;
g) Agir com frieza de ânimo com reflexão sobre os meios
empregados ou ter persistido na intenção de matar por mais de 24h;
h) Ter praticado o facto contra membro de órgão de soberania,
do Conselho de Estado, Ministro da República, magistrado, membro de órgão do
governo próprio das regiões autónomas ou do território de Macau, Provedor de
Justiça, Governador Civil, membro de órgão das autarquias locais ou de serviço
ou organismo que exerça autoridade pública, comandante da força pública,
jurado, testemunha, advogado, agente das forças ou serviços de segurança,
funcionário público, civil ou militar, agente da força pública ou cidadão
encarregado de serviço público, docente ou examinador público, ou ministro de
culto religioso, no exercício das suas funções ou por causa delas.
O Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida,
tomando por base no essencial o Relatório que o precede, é de Parecer:
que não há nenhum argumento ético, social, moral, jurídico ou
da deontologia das profissões de saúde que justifique em tese vir a tornar
possível por lei a morte intencional de doente (mesmo que não declarado ou
assumido como tal) por qualquer pessoa designadamente por decisão médica, ainda
que a título de "a pedido" e/ou de "compaixão";
que, por isso, não há nenhum argumento que justifique, pelo
respeito devido à pessoa humana e à vida, os atos de eutanásia;
que é ética a interrupção de tratamentos desproporcionados e
ineficazes, mais ainda quando causam incómodo e sofrimento ao doente, pelo que
essa interrupção, ainda que vá encurtar o tempo de vida, não pode ser
considerada eutanásia;
que é ética a aplicação de medicamentos destinados a aliviar
a dor do paciente, ainda que possa ter, como efeito secundário, redução de
tempo previsível de vida, atitude essa que não pode também ser considerada
eutanásia;
que a aceitação da eutanásia pela sociedade civil, e pela
lei, levaria à quebra da confiança que o doente tem no médico e nas equipas de
saúde e poderia levar a uma liberalização incontrolável de "licença para
matar" e à barbárie;
Código deontológico do enfermeiro O Código Deontológico do
Enfermeiro permite também orientar a análise e avaliação de opinião do
enfermeiro aquando uma tomada de decisão, por forma a garantir uma atuação
segura e legal.
Artigo 78º (Princípios gerais):
As intervenções de enfermagem são realizadas com a
preocupação da defesa da liberdade e da dignidade da pessoa humana e do
enfermeiro.
São valores universais a observar na relação profissional:
a) A igualdade;
b) A liberdade responsável, com a capacidade de escolha,
tendo em atenção o bem comum;
c) A verdade e a justiça;
d) O altruísmo e a solidariedade;
e) A competência e o aperfeiçoamento profissional.
São princípios orientadores da actividade dos enfermeiros:
a) A responsabilidade inerente ao papel assumido perante a
sociedade;
b) O respeito pelos direitos humanos na relação com os
clientes;
c) A excelência do exercício na profissão em geral e na
relação com os outros profissionais.
(…)
Artigo 82º (Dos direitos à vida e à qualidade de vida):
O enfermeiro, no respeito do direito da pessoa à vida durante
todo o ciclo vital, assume o dever de:
a) Atribuir à vida de qualquer pessoa igual valor, pelo que
protege e defende a vida humana em todas as circunstâncias;
.b) Respeitar a integridade bio-psicossocial, cultural e
espiritual da pessoa;
c) Participar nos esforços profissionais para valorizar a
vida e a qualidade de vida;
d) Recusar a participação em qualquer forma de tortura,
tratamento cruel, desumano ou degradante.
(…)
Artigo 87º (Do respeito pelo doente terminal):
O enfermeiro, ao acompanhar o doente nas diferentes etapas da
fase terminal, assume o dever de:
a) Defender e promover o direito do doente à escolha do local
e das pessoas que deseja que o acompanhem na fase terminal da vida;
b) Respeitar e fazer respeitar as manifestações de perda
expressas pelo doente em fase terminal, pela família ou pessoas que lhe sejam
próximas;
c) Respeitar e fazer respeitar o corpo após a morte.
República Federativa do Brasil
Na Constituição Federal brasileira podemos observar:
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união
indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado
Democrático de Direito e tem como fundamentos: (…)
III - a dignidade da pessoa humana.
Ainda na Constituição Federal brasileira consta o que segue:
Art. 5º (artigo que trata dos direitos fundamentais
individuais)
III - ninguém será submetido a tortura nem a tratamento
desumano ou degradante.
O Código Civil brasileiro de 2002 assim expressa:
Art. 15.
Ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de
morte, a tratamento médico ou a intervenção cirúrgica.
Já a Lei dos Direitos dos Usuários dos Serviços de Saúde do
Estado de São Paulo, de nº 10.241/99, também conhecida como "Lei Mário
Covas", assim expressa:
Art. 2º São direitos dos usuários dos serviços de saúde no
Estado de São Paulo:
XXIII - recusar tratamentos dolorosos ou extraordinários para
tentar prolongar a vida.
Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Eutanasia
em 13 de junho de 2012 às 09h47.
Para Refletir:
1) Explique sobre o que é a Eutanásia e cite um exemplo.
2) Explique a diferença entre Eutanásia Ativa de Eutanásia Passiva.
3) Explique a diferença entre Eutanásia e Suicídio Assistido.
4) Explique o argumento contrário a Eutanásia, do ponto de vista religioso.
5) Explique o argumento contrário a Eutanásia da perspectiva médica.